Políticas de controle da pandemia de Covid-19 têm sido alvo de disputas no Brasil, com autoridades divergindo sobre formas de tratamento e os efeitos das estratégias de distanciamento social. Análises recentes caracterizam tais disputas como uma “batalha ideológica” de Bolsonaro contra “argumentos racionais” de especialistas e da OMS. Além disso, críticos caracterizam Bolsonaro como um representante do “populismo científico” que produz fake news para sustentar pautas negacionistas. Neste artigo, dialogamos com o campo de estudos de Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS) para analisar os usos da ciência durante a pandemia. Demostramos que Bolsonaro não nega enunciados científicos in toto, mas busca legitimar suas políticas de saúde a partir das controvérsias públicas sobre a ciência. Ao explorar os meandros da produção de fatos científicos, o que Bolsonaro faz é questionar as credenciais da OMS e acusar opositores de politizarem pesquisas sobre formas de contenção da pandemia. Em outras palavras, Bolsonaro e seu entorno avançam uma imagem transcendental da Ciência, que reifica a divisão moderna entre o saber científico e a cultura, para criticar a contaminação ideológica de algumas instituições científicas no período de pandemia. Tal postura revela o jogo de poder epistêmico intrínseco ao debate contemporâneo sobre pós-verdade, no qual ideologia, esoterismo e desrazão são atribuídos sempre ao enunciado do outro.
Leia o artigo de Daniel Edler Duarte e Pedro Rolo Benetti em https://www.scielo.br/j/soc/a/CJmdspZCg7KyFc47gKcjcxx/?format=pdf&lang=pt